segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Valorizar as esplanadas e o espaço exterior à força

 A pouca importância que alguns restaurantes, cafés, pastelarias e bares davam à luz natural e ao espaço exterior sempre me deixou intrigado. Muitos destes espaços foram sendo instalados em edifícios que nunca foram pensados para esses fins, muitos em habitações e outros em lojas convencionais. Considerando estes condicionamentos, mesmo que se pretendesse, era difícil garantir uma boa relação com o exterior. 

A ausência de esplanadas também era comum. Quando existiam, muitas não passavam de algumas cadeiras e mesas espalhadas sem critério pelo exterior. Surgiam também aqueles casos das esplanadas totalmente cobertas e fechadas, autênticas estufas, que transformam uma suporta experiência exterior numa vivência de marquise. No fundo, esse recurso a explanadas tão fechadas, que esgotam o espaço público, são meras expansões de construção que tornam os edifícios e a sua relação com o exterior ainda mais disfuncional. 

Mas agora em contexto de pandemia, pela força da necessidade, as esplanadas abertas e arejadas são a norma. Teve de ser uma calamidade a fazer com que se descobrisse que é possível desfrutar de uma refeição ou de uma bebida ao ar livre? Obviamente que já existiam alguns espaços onde isso se podia fazer, mas este novo normal veio demonstrar que isso pode ser uma vantagem em praticamente todos os espaços, e que a qualidade das esplanadas vai ser um aspeto diferenciador. Quem tiver a melhor relação com o exterior vai prosperar. 

Parece absurdo que um país como Portugal precise de uma pandemia para apostar seriamente nas suas esplanadas. Basta viajar até outros países com climas muito mais agrestes para a vivência no exterior para perceber o nível do nosso desperdício, na incapacidade para saber valorizar o exterior, quer seja para atividades de comércio e serviços como fui referindo, quer para a disposição das próprias habitações. 

Continuamos a investir pouco nas nossas varandas e terraços. Os jardins da maioria das vivendas continuam a ser meros espaços frontais decorativos, pouco ou nada preparados para serem desfrutados por quem aí vive. São os casos das portas principais, salas de estar e jardins que se mantêm, mas para nunca serem utilizados. Provavelmente fruto de uma sociedade que ganhou mais meios materiais, mas que ainda não os conseguiu transformar em qualidade de vida. 

Tal como as vivendas, também temos espaços de comercio e serviços com potencial, mas falta aquele toque, aquele pormenor para os harmonizar com o exterior. A pandemia vai fazer também com que o espaço público exterior se valorize. Algumas esplanadas começam a avançar para espaços até agora reservados ao estacionamento automóvel. É um bom sinal e pode finalmente ser a força necessária para a melhoria da qualidade de vida nas cidades em Portugal. Só espero que não seja uma moda passageira e desgarrada dos processos de desenvolvimento urbanos. Porque para reclamar estes espaços que estavam destinados a outros fins, tais como o estacionamento, é necessária uma reformulação de todo o sistema urbano, incluindo o sistema de transportes. 


Texto publicado no Diário de Leiria


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Redundâncias da Actualidade - criado em Novembro de 2009 por Micael Sousa





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