segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Saber viver e cuidar da boa vizinhança durante o confinamento

 Nestes últimos meses fomos todos forçados a passar mais tempo em casa. Esta necessidade extraordinária veio mudar muitos comportamentos e hábitos. Forçou-nos também a refletir sobre muitas coisas que as acelerações do dia-a-dia andavam a ocultar.

Pessoas que viviam em vivendas perceberam o quão importante é o seu espaço exterior, e as que vivem em apartamentos, em sentido inverso, ficaram a desejar por uma varanda maior. Percebemos que as nossas casas portuguesas estão pouco preparadas para vivermos nelas muitas horas, especialmente os apartamentos. E, com tantas pessoas em casa em simultâneo, surgem inevitavelmente situações de propensão para conflitos de vizinhança e dificuldades de convivência comum em espaços concentrados. 

Uma das razões para implementar os princípios de planeamento urbano colaborativo são precisamente estes conflitos que ocorrem, naturalmente, nas cidades, mas também em todos os territórios em que sobreposições de interesses diferentes ocorram. Isto é muito comum na utilização de espaços e recursos públicos, ondem existem várias prioridades e visões, com algumas delas a serem verdadeiramente antagónicas. Geram-se então conflitos, jogos de soma zero, onde o que uns ganham correspondem ao que os outros perdem. O planeamento colaborativo direcionado para a geração de consenso serve para mudar esse jogo, para que essas interações se transformem em jogos de soma positiva, em que todos ganham algo, garantindo que pelo menos algumas das suas demandas são consideradas.

Isto relaciona-se com coisas tão simples como ruido entre vizinhos. Este é um dos casos mais simples fruto do confinamento forçado. As pessoas vão estar mais tempo em casa, expressando os seus modos de vida e cultura de diversas formas. Uma delas é comunicando, outra é através da música. Tendo em conta o tipo de construções correntes em Portugal, especialmente em apartamentos, isto pode gerar problemas de vizinhança. Mais ainda quando não existe uma noção de respeito mútuo, provavelmente alimentada pela falta de espaços de diálogo e de compreensão mútua, aqueles espaços que resultariam da implementação de processos contínuos de planeamento colaborativo. 

Se as pessoas, mesmo sendo recém-chegadas a um prédio ou bairro, fossem integrados em comunidades organizadas para defender os seus interesses comuns teríamos mais facilidade em resolver estes atritos evitáveis. Seriam também formas de prepararmos as comunidades para responder ao poder político ou lobbies que podem condicionar ou não defender os seus interesses. A comunidade podia ser mais pró-ativa e ter um papel de transformação nas políticas territoriais, melhorando assim a sua qualidade de vida e a própria democracia participativa através destas abordagens colaborativas. 

A pandemia e seu confinamento ajudou-nos a perceber a importância de gerar condições saudáveis de vizinhança, quer seja para termos coisas tão simples como o descanso em casa, como para a possibilidade de podermos mobilizar forças coletivas para melhorarmos o futuro das nossas cidades. 


Texto publicado no Diário de Leiria


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Redundâncias da Actualidade - criado em Novembro de 2009 por Micael Sousa





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