Tal como existe uma época balnear, existe também uma época de incêndios - ambas por razões climáticas e meteorológicas, dependentes das elevadas temperaturas. Entre as muitas diferenças que as distinguem há uma curiosidade que não posso deixar de referir: os Portugueses tendem a iniciar as suas actividades balneares mesmo antes do inicio da época oficial; já os incêndios tendem a iniciar-se e aumentar drasticamente aquando da publicitação e divulgação do inicio da dita época e da informação dos primeiros actos de fogo. Mais estranho é que durante a realização de um grande evento desportivo ou cultural, já em pleno Verão e com todas as supostas condições meteorológicas reunidas (entre outras) para que um qualquer incêndio de grandes proporções se inicie e lavre o suficiente para o tornar perigosamente importante, fica-me na altura quase sempre a ideia de que não existem incêndios em Portugal e de que não corremos esse risco – provavelmente coincidências de calendário e de meteorologia. Em jeito de sarcasmo e ironia deixo a seguinte questão: será que precisamos de “Mundiais de Futebol”, “Jogos Olímpicos”, festivais de música e afins para evitar incêndios em Portugal? Curiosidades e sarcasmos à parte – pois trata-se de assunto sério -, independentemente dessas atitudes e ocorrências mediáticas contribuírem ou não para o aumento dos incêndios, na verdade um incêndio só pode ocorrer se se reunirem três condições fundamentais necessárias, três parâmetros, tendo obrigatoriamente de existir: ignição, combustível e comburente.
Quanto ao comburente, em ambientes exteriores nada poderemos fazer para o retirar da equação que origina o incêndio. Pois, o ar que respiramos, aquele que constitui a nossa atmosfera, é composto por cerca de 21% de oxigénio – o principal comburente que existe.
O combustível, bem, esse existe por todo o lado também. Matas, florestas e agrupados de árvores são por si só um excelente combustível, especialmente inflamável e combustivo se a eles estiverem associados materiais vegetais contíguos, rasteiros e secos – aquelas espécies vegetais intituladas de “matos”, assim como outros resíduos e produtos vegetais florestais, ambos resultantes da falta de limpeza e manutenção das nossas áreas arborizadas. Aqui sim, poderemos actuar. Limpezas e ordenamento das florestas podem e devem ser feitos, criando acessos e aproveitando a biomassa residual daí proveniente enquanto combustível (produto sustentável ao nível das emissões de CO2) e fertilizantes. A solução parece fácil, mas a implementação - como todos temos visto - é difícil e exige: fiscalização e execução de planeamento e ordenamento do território por parte do Estado e poder Local; proprietários privados consciencializados para a responsabilidade de tratarem das suas florestas e terras.
O terceiro parâmetro, a ignição, talvez seja o mais passível de ser controlado – pelo menos aparentemente. Por mais “combustível” (zonas florestais desordenadas e sem manutenção) e uma atmosfera devidamente oxigenada, sem fontes de ignição o fogo não pode acontecer. O ateamento – a ignição – de um incêndio pode ocorrer de um modo “natural”, dependo do clima (altas temperaturas, radiação solar e baixos níveis de humidade), mas ser potenciado e catalisado indirectamente pela presença de lixos urbanos. Sabemos também que a acção e responsabilidade humana pode ser ainda mais directa, comprovando isso estão os comportamentos negligentes e intencionais de fogo posto. Ambas as acções são passíveis de causar incêndios de grandes proporções e ambas podem ser evitadas através da prevenção por campanhas de sensibilização e pela actuação das entidades responsáveis.
Temos evoluído, temos melhorado, mas os paradigmas mudam. Se antes os incêndios atingiam grandes proporções por falta de meios, hoje, provavelmente, eles acontecem por excesso de “combustível” (muitas vezes desordenado) e de fontes de “ignição” – podendo esses dois parâmetros ser reduzidos se todos assumirmos a nossa quota-parte de responsabilidade (autoridades e poder público incluídos).
Só espero que se evitem visões extremistas que levem à redução irreflectida de todos os parâmetros da equação do incêndio (combustível, ignição e comburente), ou seremos todos, qualquer dia, asfixiados por uma crescente falta de “oxigénio”.
(Texto publicado no Diário de Leiria em 27 de Agosto de 2010)
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