sexta-feira, 13 de abril de 2018

Planear o território para o excesso e escassez de água

Apesar da chuva ser uma coisa dos céus, a sua gestão faz-se no solo, planeando o território. Algumas regiões do país passaram, abruptamente, de uma situação de seca para a ocorrência de cheias. Estas mudanças súbitas relacionam-se com as mudanças dos padrões climáticos, aquilo que apelidamos de alterações climáticas, mais vulgarmente conhecidas por “aquecimento global”, embora a realidade não seja assim tão simples nem linear. Não estamos apenas a viver fenómenos de aquecimento devido aos gases de efeito de estufa. Os efeitos são muito mais amplos, pois o clima do planeta é um sistema, com infindáveis variáveis, e nos sistemas as alterações provavam efeitos em cadeia interativos, até que se atinja um novo equilíbrio.

Apesar da imprevisibilidade dos efeitos das alterações climáticas, temos algumas certezas. Sabemos que as mudanças podem ser súbitas, que estaremos sujeitos, principalmente em Portugal, a chuvadas muito intensas em períodos muito curtos, seguidas de vagas de calor, mas também a períodos de frio estranhos a um clima que se caraterizava por ser ameno, embora com algumas exceções geográficas.
Esta nova realidade obriga a que tenhamos de planear o território para os novos desafios climáticos, tornando-o resiliente às solicitações extremas. Só assim poderemos manter qualidade de vida e condições para mais e melhor desenvolvimento, quiçá aproveitar novas oportunidades.

Se sabemos que teremos probabilidade de períodos alargados de seca, seguidos de fortes chuvadas, temos de mudar atitudes, hábitos e adaptar as infraestruturas para esta realidade. O nosso território, especialmente as áreas urbanas, não está preparado para estas solicitações, sendo os tempos de concentração dos escoamentos cada vez mais reduzidos (os tempos em que a água se mantém no sistema de drenagem), muito devido ao excesso de impermeabilização. Continuamos a exigir novas estradas e estacionamentos, edifícios em desenvolvimento horizontal, mas isso tem consequências no aumento dos índices de impermeabilização, que contribuem para o escalar dos efeitos das chuvadas e das cheias.

Importa estabelecer novas normas, decorrentes dos instrumentos de gestão do território, de planos sectoriais para a construção e gestão urbana a várias escalas, desde o nível nacional ao nível local, incluindo os municípios que têm competências para regulamentar neste sentido. Importa reduzir as áreas de impermeabilização para garantir mais infiltração de água nos solos, sendo a criação de jardins uma solução direta, tal como optar por materiais de revestimento permeáveis em estradas, pavimentos, estacionamentos e outros. Importa constituir sistemas urbanos e rurais de bacias de retenção, para controlo de cheias e aproveitamento de água quando as secas surgirem. Os próprios edifícios devem ter sistemas de aproveitamento e acumulação de águas, com o duplo efeito de mitigar cheias e a escassez de água.

Estas mudanças não se fazem de um dia para o outro. Exigem planeamento e uma clara estratégia intencional, recorrendo a múltiplos recursos e técnicas.

Texto publicado no Diário de Leiria em 15 de março de 2018.

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